MPE pede anulação de concurso público após supostas irregularidades
Nossa Lucélia - 20.06.2016

Certame visou à contratação de advogado para a Câmara de Lucélia. Entre os problemas apontados, está a falta de informações no edital

LUCÉLIA - O Ministério Público Estadual (MPE), por meio do promotor de Justiça João Paulo Giovanini Gonçalves, ajuizou uma ação civil pública por improbidade administrativa e obrigação de fazer contra o presidente da Câmara Municipal de Lucélia, Valdemir Antônio Uemura (DEM), a Casa de Leis, a empresa OM – Consultoria Concursos Ltda. e sua proprietária, Mirian Lopes Scucuglia. A causa, que teve o valor estipulado em R$ 4,9 mil, aponta supostas irregularidades na realização de um concurso público e requer a nulidade do certame, entre outros pedidos.

A ação, que tramita na 1ª Vara da Comarca de Lucélia, já foi despachada pelo juiz Fábio Renato Mazzo Reis, para que os requeridos apresentem defesa prévia, antes da citação, em um prazo de 15 dias, a partir da data de notificação.

Conforme consta nos autos, no dia 13 de março de 2016, a Câmara Municipal de Lucélia promoveu a realização de concurso público de títulos e provas para o preenchimento de um cargo de analista legislativo – advogado.

A realização do concurso, incluindo a elaboração do edital de chamamento, recepção e deferimento ou indeferimento de inscrições, elaboração das questões, efetiva aplicação e correção das provas, entre outros atos, até o resultado final, ficou a cargo da empresa OM – Consultoria Concursos Ltda., especializada em concursos, que foi contratada por R$ 4,9 mil, com dispensa de licitação, nos termos do artigo 24, inciso II, da lei 8.666/93.

Porém, a Promotoria aponta que a realização do certame ocorreu “com violação de preceitos legais, notadamente aos princípios da publicidade e da moralidade”, previstos no artigo 37 da Constituição Federal. Por isso, defende que a nulidade do concurso deve ser declarada pela Justiça.

PROBLEMAS - Quando o concurso foi aberto, o respectivo edital, publicado na imprensa e na internet, apresentava a previsão de que a prova contaria com questões de língua portuguesa, matemática, conhecimentos específicos da área e noções de informática. Elas seriam de múltipla escolha e totalizariam 100 pontos. Para ser aprovado, o candidato deveria obter, no mínimo, 50 pontos.

Porém, conforme apontou a Promotoria, afastando-se da publicidade e da transparência que devem nortear a prática dos atos administrativos, inclusive a realização de concursos públicos, o edital do certame “não mencionou a quantidade de questões de cada matéria, nem o total de questões que a prova apresentaria, nem tampouco o peso (valor) que cada questão teria na ordem de classificação dos aprovados”.

As informações que faltaram no edital seriam de “extrema importância” para que interessados em participar avaliassem suas possibilidades de aprovação e, por consequência, se inscrevessem ou não para o certame.

O MPE afirma que, em razão da lacuna no edital, o concurso obteve um baixo grau de adesão, com apenas 45 candidatos, mesmo com uma remuneração “promissora”.

Em contrapartida, foi “expressivo” o número de candidatos que faltaram no dia da prova: 10 pessoas, o que representa uma abstenção superior a 22% do número de inscritos, conforme a Promotoria.

“Uma baixa adesão a um concurso de advogado público, em época de recessão e de flagrante desemprego, só pode ser explicada pela deficiência do edital e pela desconfiança que tal vício suscitou nos interessados”, alega o Ministério Público. “Tal deficiência atentou contra o interesse público na escolha de pessoa melhor qualificada, uma vez que a administração acabou por restringir o universo de participantes da seleção feita”, segundo o MPE.

“As omissões do edital não decorreram de mero descuido. Ela foi deliberada”, diz o promotor de Justiça.

A Promotoria ainda relata que um candidato inscrito para o concurso, por meio de telefone, alertou a Câmara Municipal e a empresa encarregada de sua realização, apontando-lhes as omissões. “Na Câmara, foi-lhe recomendado que reclamasse junto à empresa organizadora. Nesta, foi-lhe dito que o edital saíra daquela forma, a pedido da própria Câmara Municipal”, explica a ação.

Nenhuma das partes negou que o candidato entrou em contato para reclamar do edital. A empresa requerida confirmou que no dia 29 de fevereiro de 2016 foi indagada sobre as omissões constantes do edital. “Já bastava tal alerta para que o primeiro requerido e a empresa organizadora fizessem a correção reclamada”, diz o MPE.

Também é relatado que, acolhendo à representação feita pelo candidato, no dia 7 de março de 2016, a Promotoria de Justiça da Cidadania levou à Câmara Municipal a reclamação feita – recebida por ele no mesmo dia – e solicitou que se manifestasse a respeito.

“No entanto, os requeridos preferiram ir adiante e ultimar, de comum acordo, a realização de concurso que, por ofensa aos princípios da publicidade e da moralidade, arregimentou um número pífio de interessados e desatendeu ao interesse público em selecionar o melhor dentro de um universo razoável de competidores”, alega o promotor de Justiça.

Em concursos similares promovidos recentemente pela empresa organizadora, “sempre fez constar dos respectivos editais as informações que sonegou aos interessados na vaga de advogado da Câmara de Lucélia”. A Promotoria relata que em outros editais feitos pela OM – Consultoria Concursos Ltda. o texto informava o número de questões que seriam apresentadas.

EDITAIS CONFRONTADOS - Quatro editais foram confrontados, conforme apresenta o promotor de Justiça, da Prefeitura de Agudos (SP), da Câmara de Adamantina, da Prefeitura de Rancharia e da Câmara de Manduri (SP). Com a ação, foi verificado que o item relacionado às questões das provas sempre foi o mesmo: item 4.5.

No entanto, por razões não explicadas, no edital da Câmara de Lucélia houve a retirada das informações relacionadas ao número de questões e ao valor das mesmas, “sonegando-se intencionalmente relevantes informações de interesse dos participantes, maculando o certame, que apresentou obscuro critério de avaliação, tornando-o suscetível de casuísmos de última hora”, segundo o MPE.

Com os fatos, a Promotoria questiona: “Por que, nos concursos que realiza, as informações no edital, quanto ao número de questões e seu peso nas notas, são relevantes, mas isso não seria no concurso desta cidade [Lucélia]?!”

DIVULGAÇÃO - O edital foi, inicialmente, publicado em um jornal de Lucélia no dia 23 de dezembro de 2015. Nele, dizia que as inscrições seriam recebidas no período de 28 de dezembro a 10 de janeiro de 2016.

“Forçoso convir que uma divulgação deficiente de concurso, nas vésperas das festas de fim de ano, com prazo tão exíguo para a inscrição dos candidatos, só poderia ter por finalidade afastar competidores do certame, assegurando o menor número possível de participantes, frustrando o caráter competitivo do mesmo”, alega o MPE.

A Promotoria ainda acrescenta que a empresa requerida “é useira em estabelecer prazos exíguos para a realização de inscrições”. O promotor de Justiça exemplifica que, no concurso para provimento de cargos na Câmara Municipal de Manduri (SP), o prazo foi de cinco dias para recebimento das inscrições.

SUSPEITAS - A “título de curiosidade”, a Promotoria relata que o candidato aprovado em primeiro lugar no concurso, com nota disparada dos demais (92,50), em outro certame ocorrido na mesma época, realizado por outra empresa, para cargo equivalente na Prefeitura de Lucélia, obteve o penúltimo lugar, com nota 52,50, “colocando realmente o presente certame sob o manto da suspeita”.

Os fatos “geram frustrações indesejadas” e “sentimento de descrédito” nas instituições e também no modo com que conduzem os certames para a seleção de seus funcionários, segundo o MPE.

No concurso para advogado da Câmara, foram exigidos conhecimentos de português, matemática, noções de informática e conhecimentos específicos no ramo do direito e não foi dado aos interessados, previamente, o número de cada questão por essas matérias nem o peso que tais disciplinas teriam na aprovação final do candidato.

Porém, para “surpresa de todos”, foi noticiado no dia da prova que as questões de matemática, bem como as demais não relacionadas ao direito, tiveram o mesmo peso que as de conhecimento específico.

No sentido da necessidade da informação e da publicidade completa, da transparência e da segurança jurídica, no âmbito da União, é disposto que no edital de concurso deve constar explicitação detalhada da metodologia para classificação no concurso público.

“Realmente, afastando-se dos parâmetros anteriormente observados por ela mesma, a empresa organizadora, por sua representante legal, conluiada com o primeiro requerido, elaborou edital obscuro, divulgado a toque de caixa, afastando competidores e provocando elevado índice de abstenção no certame”, declara a Promotoria.

Também é ressaltado que a conduta dos requeridos “violou os princípios da publicidade, da impessoalidade, da razoabilidade e da moralidade administrativa”, pois conheciam a exigência constitucional de publicidade e transparência. Além disso, houve o alerta do candidato “a tempo de retificarem as omissões constantes no edital, mas não o fizeram. Seguiram adiante na realização de um concurso público voltado a afastar competidores”.

PROVA DIGITALIZADA - Ainda foi apontado pela Promotoria que há dificuldades para visualizar a prova digitalizada. “Esclarece-se que, no momento de inserir a digitalização dos presentes autos de Inquérito Civil no E-SAJ, o sistema reconfigurou automaticamente a imagem da fl. 171 para uma resolução compatível, resultando em sua difícil visualização, o que poderá eventualmente ocorrer com outros documentos”, salienta.

“A fl. 171 veicula a cópia do jornal onde foi publicado o edital do concurso, cuja juntada aos autos foi realizada pelos requeridos, sendo que a qualidade de sua impressão ocasionou a readequação de sua configuração pelo sistema”, explica o promotor de Justiça.

Além disso, é apresentado que a digitalização tem uma mancha branca que dificulta sua leitura e que, nos autos originais, as respectivas folhas estão da mesma forma.

PEDIDOS - A Promotoria de Justiça pede a condenação dos requeridos pela prática de ato de improbidade administrativa, impondo-se, ainda, a obrigação solidária de devolver aos participantes os valores correspondentes às suas inscrições.

Com relação a Valdemir Antônio Uemura e a Mirian Lopes Scucuglia, é requerido que percam a função pública; tenham suspensão de seus direitos políticos pelo prazo de três a cinco anos; que efetuem o pagamento de multa civil de até cem vezes o valor da remuneração percebida pelo presidente da Câmara Municipal de Lucélia, na data de propositura desta ação devidamente corrigida para os dias atuais; que seja feita a proibição de contratar com o poder público ou de receber benefícios ou incentivos fiscais, ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual sejam sócios majoritários, pelo prazo de três anos.

À OM - Consultoria Concursos Ltda., é requerido o pagamento de multa civil de até cem vezes o valor da remuneração percebida por Valdemir Antônio Uemura como presidente da Câmara Municipal de Lucélia, devidamente corrigida para os dias atuais; a proibição de contratar com o poder público ou de receber benefícios ou incentivos fiscais, ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócia majoritária, por três anos.

Outro pedido feito pela Promotoria é para que seja declarada a nulidade do certame realizado, condenando a Câmara Municipal de Lucélia a promover a exoneração imediata de quem estiver ocupando o cargo de analista legislativo – advogado, em razão do concurso público relacionado à ação.

OUTRO LADO - O presidente da Câmara Municipal de Lucélia, Valdemir Antônio Uemura, também respondendo pela Casa de Leis, confirmou ao G1 que houve um questionamento do Ministério Público quando um dos inscritos o alertou, bem como à empresa, sobre a suposta omissão de informações do edital. “Nós apresentamos todos os esclarecimentos sobre a questão”, afirmou. Ele ainda colocou que “não houve irregularidades ou má fé no certame".

"Tudo foi feito dentro da normalidade junto à empresa contratada que, em 30 anos, nunca teve problemas com a Justiça", enfatizou.

Sobre a ação civil pública, Uemura informou que ainda não foi notificado, mas que se defenderá junto à Justiça.

Também respondendo pela OM – Consultoria e Concursos Ltda., a requerida Mirian Lopes Scucuglia afirmou ao G1 que o processo de realização do certame “transcorreu normalmente”. Ela também confirma que houve um pedido de esclarecimentos por parte da Promotoria, devido às indagações de um dos candidatos do concurso. “Todas as informações foram prestadas junto com o presidente da Câmara”, relatou.

Ela também explicou que ainda não tem conhecimento sobre a ação civil pública e aguardará a notificação.


Fonte: Stephanie Fonseca _ Do G1 Presidente Prudente

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