Coisas de avô, Aldir Blanc
20 de maio de 2006 - Jose Rocha

Aldir Blanc (parceiro de João Bosco em grandes pérolas da Santa Música Popular Brasileira, graças a Deus) escreveu – um dia desses – que um neto em casa cura todas as dores e dilemas de um avô. É assim que me sinto com meu neto Igor (Igor Rocha Azevedo), nascido no dia 23 de dezembro de 2002, ele, a alegria imperativa aqui de casa.

Meus pais (que já partiram fora do combinado, como bem diz o bom Rolando Boldrin), chegaram a conhecer Igor – nome russo escolhido (para que se dê o crédito) por seu pai, o jauense Maico Luiz Azevedo (escolhido por ele, mas aprovado em plenária familiar). Minha mãe – Letícia – conviveu mais tempo com Igor do que meu pai – por conta dessas obras de Deus, que ninguém entende.

Um apaixonado por Fórmula 1 e futebol (necessariamente nessa ordem), o ensinei, cedinho, a reconhecer os carros de F1 e alguns ídolos do automobilismo brasileiro, como Ayrton Senna (que para Igor ainda é um carro e não um piloto) e Felipe Massa (desde que apareceu). Não demorou muito para que ele começasse a reconhecer – sustos meus, que não ensinei essa parte – outros pilotos, como o português Thiago Monteiro (talvez por conta daquele único podium do corredor lusitano), Jarno Truli, Giancarlo Fisichella...

Mais recentemente, Igor, que bate uma bola (força de expressão ainda) em nosso quintal, aprendeu que o grande ídolo do avô no futebol de hoje é o gaúcho Ronaldo Elias Moreira – nascido na Restinga, em Porto Alegre, em 1980. É claro que ele sofre com a pronúncia (seria querer demais para um menino de três anos), e diz Ronaldinho “Garrucho” em vez de Ronaldinho Gaúcho, mas isso se acerta, como um passe repetido e ensaiado.

Ontem comprei o primeiro pôster de Ronaldinho para Igor, que, quando joga comigo – e tem mais fôlego que eu, de sobra -, avisa que é o Ronaldinho (“de vermelho”, ele explica, por conta de um personagem do seriado infantil Power Rangers, que eu não suporto, mas essa é outra conversa). Comprei o pôster ali na banca do “seu” Jaime - Jaime Lucente -, bem no centro de Brotas, cidadezinha bucólica onde moramos, no meio do Estado de São Paulo.

E como é bom, vovô Aldir Blanc, ver o neto da gente correndo pelo quintal, chutando os sonhos numa bola de futebol e gritando gol, essa palavrinha mágica que nós, brasileiros, tanto amamos. Mais ainda: como é bom quando ele diz que, no jogo, ele é o Ronaldinho Garrucho, eu sou um jogador do meu Fortaleza (menino ligeiro esse!) e “os caras” (imaginários) que ele convida para nossas “peladas” usam o uniforme do Leão do Pici. Não tem preço que pague essas pequenas-grandes alegrias.

Fico, cá com meus botões, nesse começo de século e de milênio, a imaginar o que Igor vai ser quando crescer. Piloto de Fórmula 1, um esporte caríssimo e longe dos meus pequenos reais? Jogador de futebol, atividade mais próxima? Poeta, como eu? É... Deus, esse bondoso companheiro de todas as horas, que tudo criou e a tudo assiste (até jogo em que judiam da bola, como temos muitos por aí), é quem sabe. Mas, quando Igor não for apenas esse “menino maluquinho” também apaixonado pelo Cascão (do Maurício de Souza), certamente saberá o que vai ser.

O que me apaixona hoje, e não é para menos, é essa infância que Igor tem, tão sadia: de quintal, quintal grande, jogando futebol (com ele encarnando Ronaldinho Gaúcho no meio de campo), reconhecendo pilotos de Fórmula 1 e chamando Ayrton Senna de carro. O que virá amanhã Deus é quem domina – mas sinto que essa infância interiorana faz um bem enorme tanto a meu primeiro neto – que cura todas as dores e dilemas de um avô-coruja, como profetizou Aldir Blanc – quanto a mim mesmo, um perna-de-pau confesso.

O pequeno Igor parece mesmo que veio ao mundo também para chutar a bola pra longe, brincar de piloto em corrida imaginária e fazer sorrir a todos nós aqui em casa, porque Deus nos deu esse presente – e a mim, particularmente – como se soubesse (e acho que sabia) que eu precisava muito de sua inocente companhia. Valeu, Pai de todos nós. Meu quintal está mais alegre. Minha vida está mais alegre. E minhas partidas de futebol ficaram mais sorridentes – como o sorriso do dentuço Ronaldinho Gaúcho, que chega sempre antes dele.

José Rocha, 46, é autor de quatro livros: "Espelho quebrado", "Batatas fritas ao sol", "O verbo por quem sofre de verborragia" e "Coração de Leão".


Voltar para crônicas de José Rocha


© All rights reserved.
Contact: Portal Nossa Lucélia Powered by www.nossalucelia.com.br