14/06/2004 - Jose Rocha

Podem me dar um cartão. Eu confesso

Escrevi que Maradona era melhor que Pelé. Sim. Confesso. Foi quase isso. Mas logo ontem, quando a crônica para "El Diez" ainda perambulava pela Internet, essa janela de boas conversas, justamente ele, o Pelé, teve que chorar enquanto carregava, no Rio de Janeiro, a tocha das Olimpíadas 2004. Bastou o choro do rei - aqui, sem aspas, como coloquei na crônica anterior - para que me batesse um remorso do tamanho do Maracanã. Como foi que eu tive coragem de escrever que Maradona era melhor que Pelé? Logo eu, que vi Pelé jogar no Castelão, há 30 anos - "o tempo passa, torcida brasileira". Logo eu, que enchi a bola (cheia) de Pelé só por conta de uma goleada que o Santos - dele - aplicou no meu Fortaleza.
Tive que vir aqui ligeirinho (meu compadre Laerte Laforgia, meu amigo Paulo César Norões, meu irmãozinho luceliense Amaury Teixeira, enfim, todos, com justa razão, me puxaram as duas orelhas). Foi pouco. Este mulatinho merecia coisa pior. E tive que ver Pelé, que nunca participou de uma olimpíada, chorando pelas Olimpíadas de Atenas. Doeu. Virgem Santa! Doeu. Lembrei de meu pai, que está no céu, não tem um ano, e fiquei triste, como agora, quando me lembro dele - gostava de futebol, "seu" Manoel (gostava de Canhoteiro, Garrincha, mas gostava, acima de tudo, de Pelé!). Meu pai, que foi quem me levou pela primeira vez a uma emissora de rádio, a Uirapuru, depois de um clássico entre Ceará e Fortaleza, me arrancaria as orelhas, me tiraria o sobrenome - me transformaria em um reles monossílabo: Zé. Assim. Com duas letras e direito ao acento. Mais nada. Monossilábico. Para meu castigo.
Meu filho Thiago, grandalhão, com pose de zagueiro, de goleiro, mas que joga tão mal quanto eu, já tinha me avisado:
- Você não pegou meio pesado não, pai?
É, Thiago. Peguei. E peguei tão pesado que não segurei a bola (estava pesada demais). Ela, a bola, sempre tão delicada e nobre, estava tão pesada, que passou por mim como um chute de Nelinho, Branco, Roberto Carlos. E olha só do que fui me lembrar: daquele chute do Branco, pela seleção brasileira, que nocauteou um repórter atrás do gol. Lembram? Um repórter de óculos. Igualzinho a mim: de óculos. Acho que um castigo como aquele não me sairia mal, não. Imaginem: tomar uma paulada daquelas no olho, no meio da lente esquerda, vindo a mais de 100 quilômetros por hora. Meu Jesus! Pois foi a paulada que tomei, para aprender a me colocar atrás do gol, claro, porque, na frente dele, sou um fracasso abissal (de tomar gols e mais gols, de placa, como disse Laerte, do grande Pelé, que era nosso assunto, antes que eu me esqueça).
Mas nem só de choro (de Pelé, que não é qualquer um) foram esses dias. Esta semana, lá em Natal, meu Fortaleza venceu (de novo) nosso maior cliente: o América de Natal. 1 a 0. Gol de Mazinho Lima. E não teve só vitória do meu Fortaleza, não. Teve goleada do Ceará, nos 90 anos do alvinegro de Porangabuçu. Paloma (que nome, hein?) e seus companheiros lascaram quatro em cima da coitada da Portuguesa de Desportos. 4 a 1, se o espírito não me engana - poderia ter sido mais, viu, Capitão? E olha que eu não torço pelo Ceará, não, não sei se alguém notou, mas que foi uma farra, foi. Ah! Afarra dos 90 anos do alvinegro mais odiado pela torcida do Fortaleza. Seriam esses, Paulo César Norões, os sinais de que o futebol cearense está tomando jeito? Temos os dois times no que você, Amando Lima Jr. e Edmilson Maciel bem chamam de "G-8". Quem sabe é agora?
É. Eu sei. Mudei de assunto. Enchi a bola do Ceará (para o ódio mortal dos amigos leoninos), mas tinha mesmo que mudar de assunto (fui falar mal do Pelé!, logo do Pelé!) e tinha que registrar o baile que a Lusinha tomou. E vou dizer mais: a Portuguesa, com todo o respeito aos patrícios (eu mesmo sou bisneto de portugueses), essa Portuguesa pode ir arrumando um lugarzinho aí no futebol de Cabo Verde, de Moçambique, na Guiné, porque, no futebol brasileiro, vai ficar onde está - ou ir a canto pior. A Portuguesa de Desportos nunca mais sobre para a Primeira Divisão. Quem quer apostar comigo? Mas no botão não vale - só nos meus, para os quais confesso, com essa cara que Deus me deu:
- Para que eu fui falar mal do Pelé? Ai, Jesus!

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PELÉ ETERNO - O FILME

Sessenta anos de vida - 21 de carreira, sendo 10 deles como artilheiro do campeonato paulista -, 1375 jogos e 1281 gols. Some-se a isso a responsabilidade de falar da trajetória de uma dos nomes mais conhecidos do planeta, considerado o maior jogador do século 20. Como pode-se perceber, o desafio não foi nada fácil, mas saiu do projeto e ganha as telas, na forma do documentário Pelé Eterno, de Aníbal Massaini.

O filme demorou cinco anos para ser terminado e promete empolgar antigos admiradores do rei e a nova geração que não o viu jogar em campo. São 120 minutos com imagens de época restauradas, fotografias, depoimentos (de Zito, Pepe, Clodoaldo, Gerson, Jairzinho e outros) e até recriações de fatos que marcaram história. Entre as várias imagens de jogadas espetaculares (são mais de 300 gols no filme), marcos como a primeira vez do jogador no Maracanã, sua estréia na Seleção Brasileira e o gol histórico - o mais rápido de sua carreira, na partida Santos X Corinthians.

Um dos destaques do filme é a recriação do gol considerado o mais bonito de Pelé por ninguém menos que próprio Edson Arantes do Nascimento. Foi contra o Juventus, quando ele tinha apenas 19 anos. A imagem havia sido registrada num documentário e depois foi cortada do mesmo, desaparecendo no limbo. Para recriar a jogada, que ficou conhecida como o Gol da Rua Javari, foram ouvidas cerca de trinta testemunhas e Pelé foi para um estúdio em Nova York gravar com Luiz Briquet. Lá foram colocados dispositivos em seu corpo para que ele repetisse os movimentos, que foram captados. Tudo foi enviado para um computador, onde o gol foi trabalhado digitalmente.

Censura:Livre
Diretor:Aníbal Massaini
Elenco:(documentário)
Nome Original:Pelé Eterno
Ano:2004
País:BRA
Duração:127 minutos


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