11/06/2004 - Jose Rocha

Maradona, pelo conjunto da obra, é mais que 10!

Diego Armando Maradona está para a Argentina como Edson Arantes do Nascimento está para o Brasil. Certo? Errado. Na minha cartilha, onde só entram os "malditos"; onde só andam os "transgressores", como eu, esse Edson Arantes do Nascimento é um tremendo chato, como, aliás, bem escreveu, um dia desses, o bom e simpático Mário Prata - palestrino de carteirinha. Diego Armando Maradona, "El Diez", dito assim, à queima-roupa, ah!, já nos leva, de cara, ao grande craque argentino, que, não me canso de dizer ao meu filho Thiago, jogava muito, muito, mas muito mais que esse tal de Ronaldinho, "El Gordo", como lhe pregam os espanhóis; "El Gordo" Ronaldinho aqui - no Brasil - chamado insistentemente, pela imprensa brasileira, que cai lhe cai aos pés, como "El toro", de "fenômeno".
Edson Arantes do Nascimento, batizado por ele mesmo de "o Pelé", é um sujeito milionário, podre de milionário, o que não é da minha conta. O que me incomoda é que Edson não tem qualquer compromisso com os negros, maioria da população brasileira, que o idolatra; o que me intriga é que Edson era o mimo dos militares na ditadura (o filme "Lúcio Flávio, O Passageiro da Agonia", de Roberto Farias, começa justamente com um gol de Pelé, como era depois do AI-5, que a massa sem memória esqueceu). Cada gol de Pelé na Copa do Mundo de 1970 está diretamente associado aos porões da ditadura - e, por tabela,à tortura - a rima saiu sem querer (foi um gol contra). Pelé era um craque, sim, e eu nem discuto (perto dele, "El Gordo" Ronaldinho, o "fenômeno", é mera figuração). Essa ausência de cor do badalado "Rei" do futebol (mas todo rei com aspas é de gosto duvidoso, não é mesmo "Rei" Roberto Carlos?), essa falta de atitude do menino de Três Corações, esse aconchego com a ditadura de Médici, esse negócio de falar na terceira pessoa, tudo me fez desgostar de Pelé - e, principalmente, ou muito mais, de Edson Arantes do Nascimento.
Mané Garrincha, com seus dribles interplanetários e sua vida de dribles, torta, como as pernas que Deus lhe deu, tem muito mais a cara do futebol brasileiro, pra começo de conversa. Além do mais, Pelé sempre esteve cercado por uma muralha que impediu o povo de chegar a ele (como Edson mesmo diz, na terceira pessoa). Pelé chega a ser uma espécie de Xuxa. Edson Arantes do Nascimento, que é como ele se chama na carteira de identidade, nem isso - Edson está mais para o Senor Abravanel, aquele homem poderoso que tem um império poderoso e um canal de TV nota zero (o Senor que, para as "colegas de auditório", é o bom e sorridente Sílvio Santos, que só existe na TV). Comparei mal? Acontece. Que todo mundo entendeu o que escrevi, tenho certeza que sim, mas vou ser transparente: Edson Arantes do Nascimento, para ser a Xuxa, só precisaria ter uma Marlene Matos de babá e mandar recolher o filme "Amor, estranho amor", que é ruim de doer, antes que eu me esqueça. Não por coincidência, Xuxa, ex-namorada de Edson, é tratada, também pela mídia nacional, de "nossa Rainha".
É por aí que começo a gostar mais de Maradona que de Pelé. É por aí. Porque Maradona, com seu jeitão próprio, e não impessoal, como Edson ou Pelé, como queiram, nunca escondeu de ninguém quem ele é. Vá perguntar a um argentino se ele gostaria de ter um Maradona ao estilo do mineirinho de Bauru? Por isso, quando inventaram aquela piada de eleger os dois melhores do mundo (um pelo Colégio Eleitoral, outro pelo voto direto), deu Pelé no Colégio (que era como se elegiam muitas figuras na ditadura, caso de Paulo Salim Maluf e outros) e Maradona nas urnas eletrônicas da Internet. E que a FIFA invente o quanto quiser. Vai dar sempre o mesmo resultado. Os coleguinhas de Ricardo Teixeira vão eleger Pelé. O povo vai eleger Maradona. A CBF poderia experimentar. Sem horário eleitoral gratuito - e obrigatório! No pau. Pau a pau, como dizemos no Brasil. Será que o povo brasileiro acha Pelé tudo isso mesmo? Ou Galvão Bueno vem repetindo um velho sucesso digno de Don e Ravel? Não me cabe julgar se a dupla foi ou não foi conivente com a ditadura no Brasil. É só um jeito de corpo, como diria Caetano Veloso, que não precisa ninguém acompanhar - nem o próprio Caetano, que canta muito e fala demais.
Maradona, com sua identificação perfeita com a Argentina (e com o povo argentino, é bom que se frise), pode ser apenas Maradona ou Diego Armando Maradona. Pode ser "El Diez". De qualquer jeito, com qualquer nome, em qualquer situação, só pelo conjunto da obra, e aqui não valem só os gols, é mais que Edson Arantes do Nascimento, o Pelé. E o bom Maradona ainda me saiu com a melhor de todos os tempos: - Ronaldinho Gaúcho é, hoje, o melhor jogador do mundo.
Fico pensando cá com meus 22 botões - 11 de cada lado: o que diria Pelé? Só "Love, Love, Love"? Ou o impessoal craque brasileiro nos brindaria com Ronaldinho, "El Gordo"? Não sei, não, mas tenho minha aposta. Façam as suas. Eu, desde já, concordo com Maradona. Quem sou eu para questionar o eterno camisa 10 portenho? Eu, ruim de bola assumido, iria contra o ídolo do Boca? Mas nunquinha! E que Ronaldinho Gaúcho, ou Ronaldo Elias, como prefiro, é o melhor do mundo, hoje, eu nem discuto. Mas o legal é que Maradona disse isso. Não fui eu, um Zé, não. Foi Maradona. Com direito a um antológico gol de mão. Só Maradona mesmo. Dizer mais o que? Maradona disse - e jogou - tudo. E viva eu! E viva tu! E viva o futebol da América do Sul!

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